A realização de qualquer exercício físico pressupõe o estabelecimento de uma situação de sobrecarga para o sistema cardiovascular. A atividade física traduz-se na existência de um aumento de substâncias nutritivas e no aumento do aporte de oxigênio necessário para os músculos ativos. Secundariamente, aumentam também os níveis de anidrido carbônico e de metabólitos, os quais precisam ser eliminados. Para responder a isso, é necessária uma série de ajustes no sistema cardiovascular e em sua inter-relação com os diferentes órgãos e sistemas do corpo.
Frequência cardíaca
O controle da frequência cardíaca (FC) durante o repouso e o exercício é um bom indicador do nível de intensidade em que o coração está trabalhando e é uma informação importante do estado de saúde de uma pessoa. O músculo cardíaco responderá diretamente à necessidade de oxigênio e de fluxo sanguíneo do organismo em diferentes momentos da vida, tanto para realizar um exercício de determinado nível de intensidade como durante períodos de doença ou de necessidade externa, em que o organismo responde enviando fluxo sanguíneo aos músculos e/ou órgãos que necessitem do aporte de sangue e de O2. A frequência cardíaca é parte importante de diferentes variáveis fisiológicas. Por exemplo, junto ao volume sistólico forma o débito cardíaco. A frequência cardíaca é também parte do duplo produto.
Existe uma correlação linear entre o aumento do consumo máximo de O2 (VO2máx) durante o exercício e o aumento da frequência cardíaca. Nesse caso, com respeito ao percentual da FC máxima. A seguir, abordaremos a importância do controle da frequência cardíaca.
Frequência cardíaca de repouso
Considerações importantes:
-A frequência cardíaca de repouso (FCR) é de 60 a 80 batimentos por minuto (bpm) em média. Em indivíduos sedentários e de meia-idade, ela pode superar 100 bpm. Esportistas em forma e de modalidades de resistência podem apresentar entre 28 e 40 bpm, pelo aumento do volume sistólico, a partir de uma hipertrofia ventricular esquerda de caráter fisiológico.
-A FC normalmente diminui com a idade, tanto em repouso como durante exercícios submáximos e máximos (principalmente neste último, em consequência do processo biológico do envelhecimento).
Fatores como aumento de temperatura e altitude aumentam a FC de repouso.
-Antes do exercício, a FC costuma aumentar acima dos valores normais, o que se denomina resposta antecipatória. Devido a isso, as verificações de FC de repouso prévias ao exercício devem ser desconsideradas. A verdadeira FC de repouso deve ser verificada nas primeiras horas da manhã, quando a pessoa levanta.
-Se quando estivermos deitados nossa FC de repouso for de 50 bpm, quando estivermos sentados aumentará para 55 bpm e, quando estivermos de pé, para 60 bpm. A FC de repouso aumenta porque, quando nosso corpo passa de uma posição, deitado, para outra, de pé, o volume sistólico cai imediatamente. Isso se deve sobretudo ao efeito da gravidade, que faz com que o sangue se acumule nas pernas, reduzindo o volume de sangue que retorna para o coração. Isso, ao mesmo tempo, produz um aumento da FC de repouso, para manter o débito cardíaco de repouso.
-Por fim, determinadas doenças e medicamentos podem aumentar ou diminuir a FC de repouso.
Frequência cardíaca durante o exercício
Algumas considerações que devemos lembrar:
-Quando se inicia um exercício, a FC aumenta proporcionalmente à sua intensidade (de acordo com a capacidade física atual).
-Existe uma correlação direta entre a intensidade da FCmáx e o VO2máx durante o exercício, embora próximo do VO2máx se perca a linearidade.
-A frequência cardíaca máxima é muito importante para o planejamento do treinamento e seu controle, assim como para determinados testes de laboratório e de campo, tanto para esportistas como para a população em geral.
-Segundo a fórmula da OMS-Karvonen, a FCmáx é 220 – idade (fórmula aplicada pela Organização Mundial de Saúde [OMS]). No entanto, isso é uma estimativa, e os valores individuais variam consideravelmente em relação a esses valores médios. Por exemplo, em uma pessoa com 40 anos de idade, a FCmáx seria estimada em 180 bpm. No entanto, segundo estudos realizados, dentre pessoas de 40 anos, 68% apresentam uma FCmáx entre 168 e 192 bpm e 95% entre 156 e 204 bpm. O próprio Karvonen possui outra fórmula para avaliar o VO2máx ou a FC de reserva: FCmáx – FCR. Ambas as fórmulas são importantes para conhecer o potencial cardiovascular, mas as duas possuem margem de erro. A partir desses resultados planeja-se o pulso de treinamento.
-A fórmula da OMS é a mais utilizada na população (FCmáx = 220 – idade).
-Perde-se 1 bpm por ano de vida.
-Quando o ritmo de esforço se mantém constante, em níveis submáximos de exercício, a FC aumenta muito rapidamente, até estabilizar-se. O ponto de estabilização é conhecido como estável da FC e é o ritmo ideal do coração para satisfazer as exigências circulatórias a esse ritmo específico de esforço. Para cada incremento posterior de intensidade, a FC alcançará um novo valor dentro de um ou dois minutos.
-Apesar disso, quanto mais intenso é o exercício, mais se demora para alcançar o estado estável.
-Nesse princípio de cargas crescentes, utiliza-se um teste de laboratório para o diagnóstico da capacidade funcional.
-Após seis meses de treinamento moderado a moderadointenso, a FC durante o exercício submáximo costuma diminuir cerca de 20 a 40 bpm. A FC submáxima de uma pessoa reduz-se proporcionalmente à quantidade de treinamento realizado.
-O período de recuperação da FC diminui aumentando-se o treinamento de resistência; é uma variável considerada para avaliar o progresso do treinamento.
-Wilmore e Costill (2000) referem que quando se passa da posição de pé, em relativo repouso, a caminhar, a FC pode aumentar de 60 para 90 bpm aproximadamente.
-Fazendo jogging (trote) a um ritmo moderado de 140 bpm, pode-se chegar a 180 bpm ou mais se passamos a correr a uma grande velocidade. O débito cardíaco (DC) aumentará por duas causas: maior volume sistólico e maior FC durante o exercício, em virtude da demanda de fluxo sanguíneo e O2 dos músculos que estão trabalhando.
-Vários fatores afetam a FC durante o repouso e durante o exercício, como temperatura, umidade, horário do exercício, modificação de posição, ingestão de alimentos, etc. O uso de determinados medicamentos pode alterar a FC durante a prática de exercícios; por exemplo, os beta-bloqueadores diminuem a FC. Situações parecidas também ocorrem durante o repouso (ver Tabelas 2.2 e 2.3).
-Fatores como as modificações de posição durante o exercício (posição ortostática – como ocorre durante a corrida –, ou sentado – como ocorre no ciclismo e durante a natação) afetam a frequência cardíaca em uma intensidade similar de trabalho (ver Tabela 2.7).
Como podemos determinar a frequência cardíaca máxima prevista de uma pessoa e o pulso de treinamento?
Tanto no esporte de rendimento como nos programas de saúde direcionados à população utilizamos diferentes fórmulas, como as seguintes:
-FCmáx = 220 – idade (OMS-Karvonen)
-FCmáx de reserva ou VO2máx = FCmáx – FC de repouso (Karvonen)
-FCmáx = 208 – (0,7 × idade) (fórmula da Universidade do Colorado, EUA)
A aplicação dessas fórmulas é abordada em outros capítulos, principalmente nos Capítulos 4 e 13.
De posse dessa informação, o médico com conhecimentos de fisiologia do exercício, o professor de educação física ou o técnico do esporte, entre outros profissionais da área, podem planejar de forma simples em que faixa do percentual de intensidade da FCmáx devem treinar seu atleta, cliente ou paciente para obter os resultados esperados, criando um nível inferior e outro superior de intensidade, controlado, nesse caso, pelos bpm, o que constitui, então, a banda ou faixa de pulso de treinamento.
Em casos de doença, trabalha-se a partir da frequência de trabalho submáximo, e a fórmula que se utiliza para obtê-la é:
FC submáxima= FC máxima x 0,85
Em cardiologia e em medicina do esporte, utilizam-seas fórmulas de Vivacqua e Spagna para a reserva cronotrópica (RC) e o déficit cronotrópico (DF).
RC = FCmáx – FC de repouso (também conhecida como FCmáx de reserva ou percentual de VO2máx, utilizado por Karnoven)
DC = FCmáx prevista – FCmáx alcançada / FCmáx prevista
Débito cardíaco: a capacidade funcional do sistema cardiovascular
O débito cardíaco é o primeiro indicador da capacidade funcional da circulação para satisfazer as demandas da atividade física. Os dois fatores que determinam a capacidade do débito cardíaco são a frequência cardíaca e o volume sistólico (VS). A relação é:
DC = FC x VS
Dispõe-se de vários métodos, invasivos (como o método de Fick) e não-invasivos (como o método de reinalação), para medir o débito cardíaco. Cada um tem suas vantagens e desvantagens, sobretudo quando utilizados durante a prática de exercícios.
A fórmula do método de Fick é esta:
DC = VO2máx x 100 = mL/min / Diferença a-vO2
Em condições de repouso, o organismo dispõe de aproximadamente 250 mL de VO2máx, os quais são utilizados durante um minuto em repouso para responder ao gastoenergético, e a diferença arteriovenosa durante esse tempo é de 5 mL de O2 por 100 mL de sangue. Assim, conforme a fórmula de Fick, teríamos um DC de 5.000 mL/min de sangue, ou seja, de 5 L/min.
Débito cardíaco em condições de repouso e durante o exercício
O DC aumenta proporcionalmente à intensidade do exercício, desde 5 L em condições de repouso a um máximo de 20 a 25 L/min em homens jovens e que realizam atividade física; em esportistas de elite o DC é maior, sendo mais evidente nos esportistas de resistência, que podem ter entre 35 e 40 L/min de sangue de DC. Essas diferenças devem-se inteiramente ao grande volume sistólico de indivíduos treinados, já que o exercício físico contínuo de características aeróbias produz hipertrofia fisiológica do ventrículo esquerdo, com aumento do volume sistólico, gerando um batimento mais forte.
Em consequência disso, aqueles que realizam exercícios aeróbios possuem um DC de repouso mais econômico, com menor FC do que pessoas sedentárias, uma vez que seu VS é maior (de 70 a 71 mL em indivíduos sedentários e de aproximadamente 100 mL em indivíduos treinados). Os valores médios do DC em condições de repouso são resumidos a seguir:
Repouso
–Débito cardíaco = frequência cardíaca x volume sistólico
–Indivíduos sedentários: 4.970 mL/min = 70 bpm x 71 mL/batimento
–Indivíduos treinados: 5.000 mL/min = 50 bpm x 100 mL/batimento
Durante o exercício máximo, a diferença não é só de economia, mas também de quantidade e qualidade do DC. Ao possuir um VS maior, a pessoa treinada tem um DC maior diante de um esforço máximo. Em homens sedentários, o VS médio fica entre 103 e 113 mL de sangue por batimento, enquanto em pessoas treinadas pode ser entre 150 e 210 mL/batimento. Como exemplo, consideremos duas pessoas que realizam um esforço máximo de 195 bpm:
Esforço máximo
–Débito cardíaco = frequência cardíaca x volume sistólico
–Indivíduos sedentários: 21.450 mL/min = 195 bpm x 110 mL/batimento
–Indivíduos treinados: 34.950 mL/min = 195 bpm x 179 mL/batimento
Devemos salientar que a eficiência do trabalho é muito diferente entre os exemplos que podemos apresentar, já que o que é um esforço máximo para um sedentário (por exemplo, correr 2 km em 13 minutos e 30 segundos) pode ser um esforço submáximo ou moderado (correr esses 2 km em 12 minutos e 45 segundos) para uma pessoa que realiza atividade física aeróbia de forma sistemática e pode ser um esforço leve para um esportista de alto rendimento (que percorra 2 km em 11 minutos e 20 segundos). Os mecanismos de recuperação da FC, do VS e, por conseguinte, do DC são mais rápidos em indivíduos treinados.
Durante exercícios realizados em pé, o volume sistólico aumenta durante a transição do repouso ao exercício leve, com valores máximos que chegam a 45% do VO2máx. Depois desse ponto, o débito cardíaco intensifica-se conforme aumenta a frequência cardíaca. Os aumentos no volume sistólico em exercícios realizados em pé devem-se geralmente a um esvaziamento sistólico mais completo, em lugar de um maior enchimento dos ventrículos durante a diástole. A ejeção sistólica aumenta por meio dos hormônios simpáticos. O treinamento de fundo melhora a força miocárdica, que também contribui consideravelmente para a potência do batimento durante a sístole.
A frequência cardíaca e o consumo de O2 estão relacionados de maneira linear, tanto em indivíduos treinados como em não-treinados, durante a maior parte do exercício. Com o treinamento de resistência, essa relação desloca-se significativamente para a direita, devido à melhora no volume sistólico cardíaco. Por conseguinte, a frequência cardíaca reduz-se consideravelmente, em nível de trabalho submáximo, nos indivíduos treinados em exercícios de resistência aeróbia.
Na Tabela 2.4, observa-se o comportamento do volume sistólico em condições de repouso e durante o exercício em pessoas sedentárias, em pessoas ativas que treinam para melhorar o condicionamento cardiorrespiratório e em esportistas de alto rendimento de modalidades de resistência. Vê-se que o volume sistólico de repouso das pessoas ativas que treinam o condicionamento aeróbio ou cardiorrespiratório e o dos esportistas de resistência é praticamente igual ou superior ao volume sistólico dos sedentários durante o exercício. Se a pessoa tiver uma maior atividade de resistência aeróbia, terá um maior volume sistólico de repouso e durante o exercício.
Após um treinamento de resistência cardiorrespiratória, o volume sistólico aumenta em repouso, assim como ao realizar exercícios de nível submáximo ou máximo de intensidade. Durante o treinamento aeróbio, ocorre um aumento do volume diastólico final, causado principalmente pelo aumento do volume plasmático.
O ventrículo esquerdo é a câmara do coração mais modificada em resposta ao treinamento de resistência. As dimensões internas do ventrículo esquerdo aumentam sobretudo como resposta a um aumento no enchimento ventricular. Durante o treinamento de resistência cardiorrespiratória, a espessura da parede ventricular esquerda também aumenta, intensificando o potencial de força das contrações do ventrículo esquerdo.
A lei de Frank Starling descreve que o fator principal no controle e no desenvolvimento do volume sistólico é o grau de estiramento dos ventrículos. Quando os ventrículos se estiram mais, eles se contraem com mais força. Por exemplo, se um grande volume de sangue entra na câmara quando os ventrículos se enchem durante a diástole, as paredes dos ventrículos se distenderão mais do que quando entra um volume menor de sangue. Com o objetivo de expulsar essa quantidade maior de sangue, os ventrículos devem reagir ao estiramento, contraindo-se com mais força.
O trabalho sistemático de treinamento de resistência aeróbia ou de condicionamento cardiorrespiratório produz uma hipertrofia cardíaca esquerda com predomínio do ventrículo esquerdo, o que garante um coração mais forte e eficiente em condições de repouso e durante o exercício submáximo e máximo.
O volume ou débito sistólico previsto pode ser calculado (Ellestad) por meio da seguinte fórmula indireta:
Volume sistólico previsto em homens: VSp = 112 – (0,363 x idade) mL/min
Volume sistólico previsto em mulheres: VSp = 74 – (0,172 x idade) mL/min
O volume sistólico avaliado durante um teste de esforço é obtido, para ambos os sexos:
VS = 1.000 x DC / FCmáx = mL/bpm
Distribuição do débito cardíaco
O sangue que flui para os diferentes tecidos do organismo é geralmente proporcional à atividade metabólica realizada em estado de repouso ou em atividade física. Problemas de saúde podem alterar o fluxo sanguíneo , em condições de repouso, para diferentes órgãos. O exercício físico modifica o volume de fluxo sanguíneo no organismo, deslocando uma quantidade significativa de sangue para os músculos que trabalham.
O fluxo sanguíneo de 5 L, em condições de repouso, distribui-se em proporções aproximadas às ilustradas na Tabela 2.5. Cerca de um quinto do débito cardíaco dirige-se ao tecido muscular, ao passo que a maior parte do sangue irriga o baço, o fígado, o intestino, o trato gastrintestinal e o cérebro.
O fluxo sanguíneo durante o exercício possui uma distribuição diferente, dependendo de o exercício ser leve, moderado, intenso ou máximo (Tabela 2.6). Embora a irrigação sanguínea durante a atividade física varie consideravelmente segundo o tipo de exercício, sua intensidade e duração, o nível de condicionamento físico, o estado de saúde e a idade do indivíduo e as condições ambientais, a maior parte do débito cardíaco desvia-se para os músculos ativos.
Em repouso, em torno de 4 a 7 mL de sangue são fornecidos a cada minuto para cada 100 g de músculo. Esse débito aumenta constantemente; com esforço máximo, o fluxo sanguíneo muscular pode ser tão alto quanto 50 a 75 Ml por 100 g de tecido. Isso representa em torno de 85% do débito cardíaco total. Na Tabela 2.6, observamos as diferenças marcadas no fornecimento de sangue aos vários órgãos e o percentual que representam do débito cardíaco total nos diversos níveis de intensidade do exercício.
Observamos como órgãos importantes, como o coração, aumentam gradualmente a quantidade de fluxo sanguíneo que necessitam e, ao mesmo tempo, mantêm constante o percentual (4%) durante os diferentes níveis de intensidade de exercício. Mesmo durante o repouso, podem aumentar de 4 a 5 vezes de condições de repouso ao exercício vigoroso. Já o cérebro aumenta apenas 50 mL de condições de repouso ao exercício leve, mantendo-se constante nos exercícios moderados e máximos.
O débito cardíaco, ou volume cardíaco por minuto, pode ser previsto pelas seguintes fórmulas indiretas de Hossack:
DC previsto (homens) = 26,5 – (0,17 × idade) L/min
DC previsto (mulheres) = 15 – (0,071 × idade) L/min
O débito cardíaco durante um teste de esforço cardiorrespiratório é avaliado de forma indireta por meio da seguinte fórmula de Hossack e colaboradores:
DC previsto (homens) = (VO2máx/kg × peso kg × 0,0046) + 5,31 = L/min
DC previsto (mulheres) = (VO2máx/kg × peso kg × 0,00407) + 4,72 = L/min
DC cardiopatas = (VO2máx/kg × peso kg × 0,0046) + 3,10 = L/min
O débito cardíaco informa quanto sangue abandona o coração a cada minuto, enquanto a diferença arteriovenosa de oxigênio (dif a-vO2) indica quanto oxigênio é extraído do sangue pelos tecidos. O produto desses dois fatores indica o ritmo de consumo de oxigênio (VO2), expresso na seguinte fórmula:
VO2 = VS × FC × dif a-vO2
Existe uma relação direta entre o exercício e o aumento do DC, porque este assegura o aumento de O2 durante o exercício.
Na Tabela 2.7, observam-se, durante a prática de exercícios intensos, as alterações na FC, no VS e no DC de uma pessoa ativa, saudável e com bons indicadores de condicionamento cardiorrespiratório (não-esportista de rendimento). Tais alterações dependem da posição anatômica e do percentual de músculos usados na corrida, no ciclismo e na natação.
Fluxo sanguíneo e exercício
O fluxo sanguíneo aumenta durante o esforço, principalmente pelo exercício que desenvolve o condicionamento cardiorrespiratório, com um aumento do volume sistólico e do débito cardíaco. Esse aumento é devido a três fatores:
-Maior capilarização
-Maior abertura dos capilares existentes
-Redistribuição mais efetiva do sangue
Nas Tabelas 2.5 e 2.6, podem-se observar a distribuição e a redistribuição do fluxo sanguíneo durante repouso e durante exercícios de intensidades leve, moderada e intensa.
Pressão arterial e exercício
A pressão sistólica (PAS) aumenta em proporção ao consumo de O2, ao débito cardíaco e à progressão do exercício, enquanto a pressão diastólica (PAD) permanece relativamente igual ou aumenta apenas levemente. Com a mesma carga relativa de trabalho, as pressões sistólicas são maiores quando o trabalho se realiza mais com os braços do que com as pernas, devido à menor massa muscular e à menor vascularização que existe nos membros superiores.
Em pacientes hipertensos ou com predisposição, o estímulo do exercício escalonado, com o objetivo de levar à frequência cardíaca máxima durante um teste de esforço, pode produzir uma resposta hipertensiva tanto sistólica como diastólica, como ilustra a Tabela 2.8.
Em pessoas treinadas em exercícios aeróbios com a finalidade de prevenir doenças ou recuperar a saúde, e sobretudo em esportistas de competição, principalmente nas modalidades de resistência, durante exercícios de grande intensidade, aumenta consideravelmente a pressão arterial diferencial, elevando a sistólica e diminuindo a diastólica e produzindo uma diminuição da resistência periférica geral com o propósito de levar um maior fluxo sanguíneo e de O2 aos tecidos que trabalham (em especial aos músculos) de uma forma econômica e efetiva.
Durante o exercício isométrico (estático), com pesos e com máquinas hidráulicas, as pressões sistólica e diastólica aumentam o estado hipertensivo, o que constitui um risco para o indivíduo hipertenso ou com outra doença cardiovascular.
Como se sabe, a hipertensão arterial sistêmica (HAS) impõe uma carga crônica sobre a função cardíaca. O treinamento aeróbio (caminhada, trote, natação, ciclismo, etc.) regular, de forma individualizada e conservadora para cada paciente, produz melhora da hipertensão arterial, tanto em condições de repouso como no exercício submáximo. Devemos ser cuidadosos com os estágios graves e muito graves da HAS; apenas com acompanhamento médico a prática de exercícios físicos é indicada para esses indivíduos.
Pacientes com hipertensão arterial leve podem realizar, sem exageros, exercícios de força, de caráter isotônico ou dinâmico (ver Capítulo 4), sempre sob prescrição médica e com pressão arterial normal.
Devem-se observar as seguintes considerações:
-Antes de mais nada, deve-se recordar que a pressão sistólica de repouso oscila entre 135 e 100 mmHg e que a diastólica ou mínima, entre 85 e 60 mmHg.Podem-se observar valores tensionais normais, principalmente no sexo feminino, entre 100 e 90 mmHg de sistólica e 60 mmHg de diastólica. Uma pressão normal típica é de 120/80 ou 110/70 mmHg, o que assegura uma pressão diferencial de 40 mmHg.
-A pressão (ou tensão) arterial sistólica aumenta, durante o exercício, proporcionalmente ao consumo de O2 e ao débito cardíaco, que aumenta durante o exercício progressivo. A pressão diastólica permanece relativamente igual, aumenta levemente ou diminui, dependendo do grau de atividade da pessoa, do estado de saúde e do tipo de exercício realizado.
-Em esportistas submetidos a esforços máximos, pode-se obter 200 a 250 mmHg de PAS. Relataram-se 240 a 250 mmHg em esportistas de alto nível e saudáveis.
-A atividade física sistemática melhora a qualidade da resposta da PAS e da PAD durante o exercício, elevando a pressão arterial diferencial.
-Durante um exercício máximo progressivo, podemos encontrar em esportistas, sobretudo de modalidades de resistência, valores de 250 mmHg na sistólica e de 30 ou menos na diastólica, garantindo uma pressão arterial diferencial grande, para obter a eficiência do aumento do débito cardíaco com um maior fluxo de sangue e de oxigenação para os músculos.
-Indivíduos sedentários e/ou com hipertensão arterial não respondem de forma fisiológica ao exercício aeróbio, com dificuldades na pressão arterial diastólica, que geralmente aumenta, diminuindo a pressão arterial diferencial, que torna o trabalho menos econômico.
-Na hipertensão arterial leve ou moderada, a atividade física aeróbia sistemática diminui, em condições de repouso, uma média de 11 mmHg da PAS e de 8 mm da PAD, reduzindo, assim, a pressão média (ver Capítulo 6).
-Um aumento de 15 mm na pressão arterial diastólica durante o exercício é considerado uma resposta anormal ao exercício, sobretudo em pessoas "aparentemente saudáveis".
-A resposta ao trabalho de halterofilismo de grande intensidade e volume pode chegar até o valor patológico de PAS de 480 e de PAD 350 mm (480/350 mmHg), segundo refere Wilmore (2000), em pessoas hipertensas e que praticam halterofilismo ou fisiculturismo de forma intensa e perigosa.
-O treinamento de força isotônico bem-realizado não gera problemas de saúde em pessoas saudáveis. É um método importante de exercícios para melhorar de forma notável o condicionamento musculoesquelético e também colabora com o condicionamento cardiorrespiratório (ver Capítulos 4 e 6).
Veja no Capítulo 6 a classificação da pressão arterial e da hipertensão arterial segundo a Organização Mundial de Saúde.
-A pressão diferencial é obtida subtraindo-se a pressão arterial diastólica da pressão arterial sistólica; por exemplo: se a PA de repouso for 120/80 mmHg, a pressão diferencial será 40; para uma PA de 220/30 durante o exercício de um atleta de esporte de resistência, em um teste de esforço máximo progressivo, a tensão ou pressão diferencial será de 190 mmHg.
-A pressão ou tensão arterial média (PAM ou TAM; ver Capítulo 6) é obtida por meio da seguinte fórmula:
PAM = PAS + (2 x PAD) / 3
-Vivacqua e Spagna (Lamb, 1985) propuseram uma avaliação de parâmetros da pressão arterial com respeito à pressão arterial durante repouso (basal) e esforço, relacionada aos equivalentes metabólicos de tarefa (METs) alcançados durante o esforço, que se expressam em mmHg/MET. Essa avaliação é usada principalmente em cardiologia, mas também em medicina do esporte. As fórmulas são as seguintes:
– Variação da pressão arterial sistólica (VAR PAS):
VAR PAS = PAS máxima – PAS repouso / METs
– Variação da pressão arterial diastólica (VAR PAD):
VAR PAD = PAD máxima – PAD repouso / METs
Lembrar que 1 MET equivale ao consumo metabólico de uma pessoa sentada e em condições de repouso (1 MET= 3,5 mL O2/kg/min).
Para garantir que uma pessoa possa caminhar a um passo normal, necessita-se de 5 METs (17,5 mL de O2/kg/min). Esse tema é abordado nos Capítulos 4 e 6.
Duplo produto
O consumo de O2 pelo miocárdio e o fluxo miocárdico de sangue são diretamente proporcionais ao produto da frequência cardíaca e da pressão arterial sistólica, o que é definido como duplo produto (DP).
DP = FC x PAS
O DP é uma estimativa do trabalho do miocárdio e do VO2máx.
Em cardiologia, utiliza-se o duplo produto para avaliar o risco cardiovascular ao esforço físico, tanto por aumento da FC quanto da PAS.
O DP é utilizado para análise comparativa em um mesmo indivíduo, para avaliar a ação terapêutica de um medicamento e sua utilização ou não e para a prescrição de exercícios físicos e de procedimentos clínicos de cardiologia, como a evolução da revascularização miocárdica.
Durante exercícios contínuos, a FC e a PAS aumentam paralelamente com a intensidade do esfoço, como ocorre nos testes máximos de ergonomia funcional.
Nos esportistas, sobretudo das modalidades de resistência, e em pessoas ativas e saudáveis que realizam exercício de forma sistemática para melhorar o condicionamento cardiorrespiratório, o duplo produto diminui em condições de repouso. O DP é utilizado pelos cardiologistas e pelos médicos do esporte.
Segundo Ellestad, obtemos o duplo produto (mmHg/ bpm) por meio das seguintes fórmulas:
DPmáx previsto = 360 – (0,54 x idade) x 100
DPmáx avaliado = PAS x FCmáx
A partir da obtenção do DP, podemos saber de forma indireta o VO2máx do miocárdio (Hellesterns et al., in Lamb, 1985), que se expressa em unidade de mL x 100 g de ventrículo esquerdo, e o déficit funcional do ventrículo esquerdo (DFVE), que se expressa em porcentagem; ambos são muito utilizados em cardiologia, mediante as seguintes fórmulas:
VO2máx do miocárdio = (DP x 0,0014) – 6,3 mL
DFVE = 100 x DPmáx previsto – DPmáx alcançado / DPmáx previsto
Utilização de oxigênio pelo miocárdio
Em repouso, cerca de 80% do oxigênio que flui pelas artérias coronárias é extraído pelo miocárdio. Essa extração de alto nível significa que as demandas elevadas de O2 para o miocárdio, durante o exercício, só podem ser atendidas com um aumento proporcional da irrigação sanguínea coronariana. Durante esforço intenso, a quantidade de fluxo sanguíneo coronariano aumenta cinco vezes para atender a demanda de O2 acima do nível de repouso.
Como o miocárdio é um tecido essencialmente aeróbio, deve ter uma provisão contínua de O2. O impedimento do fluxo sanguíneo coronariano causa dor anginosa e pode provocar um dano irreversível ao músculo cardíaco, como no infarto do miocárdio.
Os principais substratos que geram energia no miocárdio são a glicose, os ácidos graxos e o ácido láctico. O percentual de utilização desses substratos dependerá da intensidade e da duração do exercício.
Algumas considerações sobre variações hematológicas no exercício
Durante a atividade física, ocorrem alterações hematológicas, dependendo do tipo de exercício, da duração, da intensidade, da temperatura ambiental, do grau de treinamento, do nível de hidratação, da postura, etc. Tais alterações podem modificar esses parâmetros.
O treinamento bem-planejado permite modificações necessárias nas variações hematológicas, tanto com fins de alto rendimento como nos programas de saúde dirigidos à população. Essas modificações são menos bruscas pela adaptação ao exercício, como se verá a seguir.
Hemoconcentração e hemodiluição
A hemoconcentração refere-se ao aumento progressivo dos componentes intravasculares devido à perda contínua de líquido plasmático da corrente sanguínea. A hemodiluição é o contrário, o conteúdo vascular aumenta graças a um ganho resultante de líquido proveniente do espaço intersticial. Os elementos figurados e os solutos diluem-se.
O trânsito de líquidos pelos tecidos depende do equilíbrio entre pressões hidrostáticas e coloidosmóticas capilares e teciduais. Assim, a tendência à hemodiluição ou à hemoconcentração depende de vários fatores específicos:
- Quanto maior a temperatura ambiental maior será a tendência à hemoconcentração, devido, logicamente, à eliminação de suor.
- Gravidade e duração: a magnitude da hemoconcentração costuma ser propocional ao exercício intenso e prolongado. Durante trabalho intenso e curto, também a observamos.
- A postura de execução pode condicionar a resposta. Um exercício em posição ortostática facilita a hemoconcentração, porque predomina a filtração no leito capilar da parte inferior do corpo.
- O estado de hidratação pode influir qualitativa e quantitativamente nas respostas do volume intravascular ao exercício. Comprovou-se que reposições líquidas durante o esforço podem atenuar a hemoconcentração gerada no treinamento e na competição.
Capacidade de transporte de oxigênio pelo sangue
É um fator determinante da capacidade física e tem como base a concentração de hemoglobinas (Hb), o número de hemácias circulantes e a eficácia de suas funções. O exercício físico gera aumentos na concentração de hemoglobina, no hematócrito e na contagem de eritrócitos no sangue periférico, por:
- Desidratação.
- Catecolaminas, que provocam contrações de reservatórios sanguíneo s como o baço ou o fígado, capazes de liberar certa quantidade de eritrócitos para a circulação.
- Duração do exercício (em exercícios prolongados, observou-se redução nos parâmetros hematológicos, por causas que serão explicadas posteriormente).
Índices hematológicos
Os estudos realizados nos índices de volume corpuscular médio (VCM), hemoglobina corpuscular média (HCM) e concentração hemoglobínica corpuscular média (CHCM) mostram resultados contraditórios. Esforços curtos até o esgotamento parecem não modificar a concentração, e exercícios muito prolongados levam à desidratação do eritrócito, para compensar a hiperosmolaridade plasmática, razão pela qual se podem observar VCM diminuído e CHCM aumentada.
Anemia esportiva
A anemia esportiva ocorre com mais frequência nos esportes de resistência, principalmente no atletismo de fundo e na natação, devido ao treinamento prolongado e intenso em determinadas etapas. As causas são as seguintes:
- Expansão plasmática pós-treinamento
- Aumento da hemólise durante esforço
- Hemorragias digestivas e urinárias repetidas em algumas ocasiões (seu efeito principal é por efeito mecânico)
- Alterações na eritropoese
Considera-se anemia esportiva valores próximos à anemia clínica:
- Hb < 12 g/100 mL de sangue nas mulheres
- Hb < 14 g/mL nos homens
No treinamento adequado com bons mecanismos de recuperação, inclusive uma alimentação balanceada, evitase consideravelmente a anemia.
Eritropoese
O exercício é um importante regulador do sistema eritrocitário, ajudando a eliminar os eritrócitos mais velhos e alterados e estimulando a produção e o rejuvenescimento dos elementos circulantes. Após o exercício e o treinamento, ocorre um aumento da eritropoese, já que aumenta, no sangue periférico, o número de eritrócitos jovens e de reticulócitos. As catecolaminas têm um efeito liberador de reticulócitos sobre a medula óssea, e as modificações de pressão nesta, pelas contrações musculares, ajudam na sua liberação.
A eritropoetina é um hormônio sintetizado nos rins, o qual regula a proliferação dos eritrócitos e cujo aumento se atribui a vários fatores:
- Hipoxia tecidual (principalmente renal). Há esportes treinados em uma altura média de 2.000 a 2.500 m, para estimular a eritropoese.
- Presença de diferentes hormônios: catecolaminas, T3, T4, costicosteroides, androgenona, etc.
- Hipoglicemia pós-exercício.
- Aparecimento de produtos da hemólise.
Efeitos do treinamento no sistema eritrocitário
Os esportistas de elite, submetidos a fortes treinamentos com uma adequada recuperação das cargas, de forma geral, apresentam valores iguais ou mais baixos do que os da população normal, provavelmente devido a uma adaptação de seu volume plasmático, expandido até cerca de 20% (hemodiluição).
Isso melhora consideravelmente as condições físicas do sangue em sua circulação pelos vasos, eleva a capacidade de resistência ante o esgotamento e melhora a eficiência da sudorese. Também pode aumentar a produção de elementos figurados, que é proporcionalmente menor do que a expansão do volume plasmático. Essa expansão depende, a princípio, da atividade da aldosterona, hormônio que facilita a retenção de água, e mantém-se posteriormente por maior síntese de albumina, a qual aumenta a pressão coloidosmótica do plasma e manifesta-se também por uma conservação da água a longo prazo.
A prática de exercícios, por meio do desenvolvimento do condicionamento físico cardiorrespiratório (aeróbio), apresenta também esse benefício.
Sistema leucocitário
Ocorre um grande aumento de glóbulos brancos após a realização de exercícios. Durante exercícios intensos e de curta duração, observa-se elevação dos linfócitos. Em exercícios prolongados, ocorre aumento dos neutrófilos. Essa leucocitose é atribuída aos seguintes fatores:
- Mobilização de leucócitos, que, em condições normais, se encontram marginados na parede vascular. Em última instância, a adrenalina seria a responsável por essa desmarginação. É muito marcada em atletas de maratona.
- Hemoconcentração generalizada.
- Resposta inflamatória a uma lesão tecidual local. Os impactos repetidos e a tensão muscular elevada podem provocar uma neutrofilia, que é a responsável pela leucocitose nos maratonistas.
- A acidose também foi implicada na produção de leucócitos e na mobilização de plaquetas. Dessa forma, exercícios com menor nível de acidose parecem provocar menores leucocitoses.
Plaquetas
O treinamento de alta intensidade e de curta duração pode aumentar as plaquetas. O exercício moderado e prolongado não parece modificá-las.
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